Os curiosos e as mil-folhas

Se é verdade o ditado “a curiosidade matou o gato” – e não o dono do churrasquinho da esquina –, o mesmo não podemos afirmar sobre o homem. A curiosidade é uma das grandes responsáveis por termos mudado e inventado tanto. Podemos pensar sobre isso a partir de uma ótica macro-social-antropológica, ou podemos também identificar essas conquistas olhando apenas para nossa vida cotidiana.

Dos 12 aos 30, eu fui uma aventureira na cozinha e, de tempos em tempos, me dedicava a preparar algo sem muito embasamento ou qualquer experiência anterior. Comia, e a aventura acabava. A partir dessa idade, e de uma significativa mudança de rotina, a cozinha começou a fazer parte do meu dia a dia. Continuei a aventura, mas a essa altura, as etapas dos processos me intrigavam. Um bom exemplo da minha curiosidade típica é a massa folhada: era fato visível seu crescimento e transformação em diversas, delicadas e crocantes folhas; mas, o que possibilitava esse acontecimento ali, dentro daquela tira fina? Por sorte, não fui a primeira a fazer tal pergunta. Encontrei uma boa bibliografia para me guiar pelo fantástico mundo da química na gastronomia e, aos poucos, aprendo e entendo melhor o que antes apenas observava.

receita mil-folhas

Em um desses livros, o Larousse das Sobremesas, Pierre Hermé ensinou-me como isso acontece. Segundo ele, “O modo de preparo da massa folhada consiste em alternar camadas de manteiga e de massa. Durante o cozimento, a água contida na massa evapora, mas fica retida pelas camadas impermeáveis de matéria gordurosa. Como o vapor ocupa mais volume que a água que o formou, as camadas de matéria gordurosa ficam separadas.”.

mil-folhas

Eu achava que o nome mil-folhas vinha dessa transformação, mas, Lucrecia Zappi – cuja curiosidade a levou a escrever um livro inteirinho dedicado à história dos doces e suas modificações ao longo dos tempos – conta que esse nome foi atribuído por um confeiteiro no início de 1800. Carême, conhecido como  “cozinheiro dos reis e rei dos cozinheiros”, criou um bolo com “exatamente 729 camadas de massa e 729 camadas de manteiga, uma arte da dobradura da massa folhada, que já era conhecida entre os gregos e os árabes. Como todo cozinheiro usa a praticidade para criar o fantástico, Carêne, ao invés de perder a conta, arredondou o número e chamou-o logo de mil-folhas.”.
E nós, seres humanos curiosos, seguimos questionando, pesquisando, aprendendo e degustando, exercitando nosso potencial criativo e compartilhando seus resultados.

mil-folhas

Se a curiosidade extrapolou esta tela, aconchegue-se em um sofá e saboreie o livro que citei da Lucrecia Zappi, o mil-folhas – história ilustrada do doce, lançado pela editora Cosac Naify.

Para fazer seu próprio mil-folhas, aqui está a receita.

é o nome que sempre é usado, porém o nome do medicamento é Citrato de Sildenafil, como já havia dito.

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4 comentários

  1. Adorei ler, Maria! Seu texto é sempre um prazer!

  2. Dalva Maraci diz:

    Olá Maria,

    Será que este cozinheiro Carêne, que você mencionou, não seria Marie-Antoine Carême (Paris, 8 de Junho de 1783 — 12 de Janeiro de 1833)?

    Abraços,

    Marie-Antoine Carême

    1. Oi, Dalva! Tudo bem?
      Estou viajando, mas assim que retornar para casa, onde está o livro Mil-Folhas, checarei e trarei a resposta para cá. :)

      1. mariacapai diz:

        Ortografia corrigida, Dalva! Muito obrigada pela preciosa revisão. :)

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